"Sexo verbal não faz meu estilo, palavras são erros e os erros são seus... Não quero lembrar que eu erro também."
Renato Russo
"As palavras surgiram num sonho e eu as escrevi quando acordei, sem saber ao certo o que significavam ou a quem se aplicavam"
Neil Gaiman

quinta-feira, 18 de maio de 2023

De onde não viemos

 Alguns dizem que viemos do pó. Mas água corre em nossas veias. Nosso corpo transcende água. O nosso cansaço é transformado em água. As nossas lagrimas são as águas do mar. Por meses dormimos no colo da água até o ar arder em nossos pulmões.

Quem me conhece sabe que gosto de correr. Através da corrida eu consegui respeitar as minhas emoções, a desenvolver a minha autoestima. No som do asfalto eu encontrava paz. Mas nós somos mutáveis, como a água mudamos de forma, de estado, de lugar, de sabor. E eu estava cansada. A corrida, que ainda é minha parceira, já estava desgastada por conta de outros trajetos que comecei a percorrer. O caminho estava confuso. E tudo bem, né? Dei um descanso pra ela. E fui aprender algo novo. Nadar. Que eu não sabia.

Assim como a corrida teve o seu papel. A natação veio para me ensinar. Ensinar quem eu sou, até onde posso ir e o quanto posso alcançar. Veio mostrar que se desafiar pode ser algo límpido, insípido, incolor, inodoro, inócuo. Talvez depois de um tempo ela perca o seu protagonismo pra dar espaço a outro desafio. Assim como ondas do mar, que vão e vem. Que sobem e descem. Sem um compromisso compulsório, mas de uma existência responsável. Não é uma obrigação.
Desafie-se sempre a aprender novas habilidades. A descobrir novas possibilidades. Desafie-se a conhecer novas coisas sobre si. Veja a água que há em você e em como ela é fluída. Seja como a água em seu movimento.

Como o rio, calmo e tranquilo em sua aparência. Mas forte e implacável em sua essência. Como o mar em seus momentos de força e poder, mas é cheio de vida e milagres em sua imensidão. Como lagoas tão lindas e rodeadas de paisagens encantadoras, mas profundas e secretas em seus mistérios.
Nós não viemos do pó. E nem voltaremos ao pó. 
Da água viemos e em água nos transformaremos como as águas se tornam chuva e alimentam outros ciclos da vida.



quarta-feira, 5 de abril de 2023

"Eu vejo isso por cima de um muro de hipocrisia" como já dizia Lulu

 Vivemos tempos de intolerância.

Somos intolerantes com tudo que não nos diz respeito (que não é da nossa conta mesmo: a vida dos outros). Queremos, a todo momento, julgar, cercear, impedir. Os corpos alheios, as escolhas alheias, as crenças alheias. E a grande justificativa é a Gabriela: "eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim". O ser humano só está aqui porque evoluiu e assumiu que estava errado em algum momento da história. Só estamos aqui porque mudamos atitudes, crenças, percepções. Já vimos negros serem escravos e humilha-los era a coisa mais normal do mundo. Bruxas já existiram e a atitude correta era queima-las na fogueira. Judeus já foram indignos de viver. Há alguns meses tivemos guerras. Intolerância. A ideia fixa de que eu sei o que é certo pro mundo inteiro e pra vida das pessoas. Eu sei o que é bom pra você, eu sei o que vai acontecer no futuro, de certo! Nós evoluímos, aos poucos, e por isso ainda não estamos extintos. Evoluímos, seja por necessidade, humanidade, humildade ou o por oportunismo, porque percebemos os danos que causamos à nossa própria existência. Isso se dá mudando atitudes, ideais: assumindo um erro, seja lá qual o viés utilizado. Evoluímos pra não morrer. E será que já estamos tão perfeitos que não precisamos nos questionar? Uma sociedade que acha que não tem nada de errado, não evolui e vai, inevitavelmente sucumbir ao ódio e a intolerância. O fato de eu acreditar em algo, não torna isso verdade para os outros. Não seja um limitador da liberdade alheia. A liberdade de pessoas antes de você já foi limitada. A sua crença, a sua cor, a sua escolha de vida, em algum momento na história já foi condenada. Não seja tão hipócrita e nem tão ingênuo em achar que existem verdades absolutas. Que a sua convicção é melhor que a dos outros. Que não tem mais nada pra aprender. Lembre-se: você não tem que concordar com religião, orientação sexual, identidade de gênero, legalização do aborto. A sua "opinião" (cheia de julgamentos e falas de ódio) não importa, afinal. O que você acha não muda em nada o que as pessoas sentem ou pensam. E Vou dizer uma coisa chocante: você não manda na vida dos outros, por mais que queira!

sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Reticências...

Você já se sentiu assim? Sem saber pra onde ir? Que escolha fazer? Que sua vida tem mais interrogações que exclamações? A sensação de que já tentou muito, e ao mesmo tempo nada? Que pode fazer tudo o que quiser e ao mesmo tempo nada te brilha os olhos? Já se sentiu impotente e poderosa ao mesmo tempo? Mas parece que nada faz sentido. Que as escolhas são um vazio sem fim. 

Será que estou louca?

Quando senta em um café e vê tantas pessoas,  aparentando tanta convicção. Tanta certeza. Por que eu tão instável? Por que nunca estou satisfeita? Queria que as respostas estivessem no final de uma xícara de café. No fundo de um copo de cerveja. No fim de uma taça de vinho. Que as respostas estivessem em um carro que passa na rua. Na última luz que se apaga de um apartamento distante.

No silêncio da casa quando todos vão dormir. Na ultima página do livro que ainda não li. A resposta que eu ainda não entendi. Presa e perdida em algum lugar desse mundo. Uma solução. Um acalento. Um suspiro.

Quem eu serei daqui 40 anos? Como estarei? Que sonhos ou decepções eu terei? Essas perguntas me angustiam. E eu não tenho nenhuma resposta reconfortante pra dar a mim mesma, que não sejam as próprias escolhas que faço agora.  As quais eu nem sei se quero fazer.



sexta-feira, 4 de novembro de 2022

"Aprende que não importa onde já chegou, mas onde está indo..." Ou será como estou indo?

 Hoje, depois de voltar de uma corrida (quem me conhece sabe eu curto correr), eu usei a seguinte frase pra mim "nossa, foi minha pior corrida até hoje". Durante o caminho, principalmente no início,  pensava "que difícil", "não vou dar conta", "não vou conseguir", "estou ruim na corrida". A corrida é uma forma de meditação pra mim, então comecei a observar o que eu estava dizendo a mim mesma. Percebi-me desvalorizando o que eu estava fazendo. Eu estava dando o melhor de mim! Por que o melhor que podemos dar não é suficiente? Eu coloquei as músicas que eu mais gosto. A música me ajuda a distrair, por vezes canto, tento entender o idioma. Ela me ajuda a permanecer no caminho. E ainda assim, terminar um objetivo era mais importante do que viver o trajeto: aproveitar a musica, o sol  suave e fresquinho, aproveitar um momento que é só eu comigo mesma. A gente foca tanto no que "tem que fazer", que esquece de observar o que está fazendo. Por fim, eu fiz o objetivo que eu pretendia? Não. Mas eu fiz alguma coisa. Autoestima é isso: você saber que nem sempre vai conseguir. Mas saber que você consegue, porque fez. Valorize seu caminho, valorize o que está fazendo, valorize os passos que já deu e os passos que está dando e, assim, prosseguir será o seu resultado.

terça-feira, 2 de março de 2021

Anda menina. Levanta esse rosto. Solta o cabelo. Desiste dessa mania de querer ser perfeita. Larga da culpa porque errou. Vamos. Brinca com aquelas violetas. Coloca seu vestido de flor. Dança a sua musica favorita. Arranca o sorriso do peito. Joga fora esse travesseiro manchado. Muda de perfume. Pinta a unha em casa. Vai sair com as amigas. Vai abraçar quem você tem vontade. Vai sentir o vento no rosto. Chora na chuva. Grita na boate. Liberta-se. Desfaz as amarras. Sai do casulo. Deixa o ar curar. Abre as janelas. Gasta seu dinheiro. Anda descalça. Atenda a porta descabelada e com sua roupa velha. Faz um coque. Corta o cabelo. Dorme um pouco! É Por isso é que a gente acorda. Sonha, menina. Resgata seu sonho da gaveta. Do guarda roupa. De baixo da cama. Do cofre. Das correntes. Das amarras. Olha pra ele. Ilumina esses olhos. Lava esses olhos. Lava sua alma. Lava tudo. Se lambuza de novo. Ri de si mesma! Reinicia tudo. Morre um pouco. Nasce de novo. Liga o foda-se. Pergunta "e daí?". E daí mesmo, né? A Que fim leva, afinal? Fim, final, enfim...Sempre tem outro começo mesmo, ao final...



terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Quem estou?


Uma das coisas que têm feito parte da minha rotina ultimamente são autoavaliações: das minhas escolhas, das situações pelas quais já passei, dos ideais que eu tinha e foram desconstruídos com o tempo. Do que eu achava certo mas que na verdade não havia “errados”. Não pense que estou criticando que eu era. Na verdade, hoje, agradeço quem eu fui, pois essa pessoa me permitiu construir a história de quem escreve hoje. O destino é, na realidade, a consequência das nossas escolhas. Cada movimento que fiz, cada lágrima que chorei, cada opção que resultou em decepção, cada alegria que me permiti sentir, cada emoção que explodiu, me trouxeram aqui. Eu poderia ter feito escolhas diferentes, e ter me tornado alguém diferente. Quem eu seria? Jamais saberei. É incrível o quanto eu me achava madura na juventude, e o quanto me considero imatura hoje. Quantas convicções irrefutáveis eu tinha e acreditava que essa teimosia era que me fazia forte e sábia. Quanto mais me abri para o vazio do “eu não sei”, mais desfrutei da beleza do aprendizado. E como é difícil se desgarrar de uma crença, não? Que sensação de fracasso e humilhação é acreditar em uma coisa e, cinco minutos depois dizer “realmente estou equivocada”. Mas a leveza e a libertação de quando o fazemos é muito maior do que essas sensações mal interpretadas. Quantas vezes me feri, me culpei, me julguei e tentei me encaixar em um modelo estereotipado de formas de conduta e de interpretação da realidade. Quantas vezes tentei enfiar este ser, este corpo dentro de uma caixa em que ele não cabia, ou era tão grande que fazia tudo ser sempre distante? Quantas vezes olhei pra mim mesma no espelho e reprovei os erros que cometi e condenei as emoções incontroláveis que não consegui sufocar. Hoje converso sozinha comigo mesma, gesticulo e rio. Hoje deixo meu corpo viver as emoções sem culpa-lo por isso. É só eu. É tudo eu. É o meu corpo. E olhando ele no espelho vejo o quanto real eu sou. E me vem um estalo: quanto de história eu sou!
O quanto este corpo tão condenado um dia foi e quanto de liberdade ele conseguiu até hoje.
O corpo conta uma história na linha do tempo. Ao se olhar no espelho, qual a história que o seu corpo conta?


 Somos criados para evitar a dor e, por isso, não sabemos o que fazer quando ela vem. Somos orientados a sermos exímios vencedores, mas não sabemos o que fazer quando o fracasso se prende em nossas mãos. Aprendemos que somos especiais, mas entramos em desespero quando percebemos que não sabemos o que queremos. Somos orientados a querer um monte de coisas que não sabemos de onde vem. Devemos ser tanta coisa que, com o tempo percebemos que estamos atolados em dívidas que não queríamos ter. Devemos ser melhores. Devemos ser bons. Devemos ter sucesso. Devemos ser felizes. Mas, no fundo, não fazemos ideia do que essas palavras significam. Temos milhares de opções expostas na nossa frente, mas nenhuma delas fomos nós que escolhemos. Por milhares de anos, fomos orientados a nos colocar em uma posição de superioridade e nos assustamos quando percebemos os podiums da nossa ignorância. Acreditamos que só merecemos o que é bom, mas não sabemos como sermos bons. Nos mandaram evitar a faca, o medo e a tristeza. Mas não nos ensinaram o que fazer quando os encaramos. Nos disseram que temos que correr atrás do que queremos, mas não disseram que era uma competição. Acreditamos fielmente que temos que aproveitar a vida, mas não percebemos o preço que temos que pagar. Acreditamos que somos livres, mas temos que dar nome a tudo o que fazemos. Olhamos para a vida e achamos que fazemos nossas escolhas, mas não percebemos que o que somos está catalogado em dicionários. “Quando olhamos muito tempo para o abismo e ele nos olha de volta”, percebemos que vivemos uma solidão coletiva. Aprendemos que precisamos de companhia, mas não nos ensinaram o que fazer com a gente mesmo. Nos disseram que somos predadores evoluídos, mas não disseram o que fazer quando queremos fugir. Nos fizeram acreditar que temos que dar valor a vida, mas não disseram que a morte faz parte dela.